segunda-feira, 13 de dezembro de 2010

Os caixões podem entrar em Gaza

Escrito por: Mohammed Omer/IPS

 
 
 
 Samir Tahseen Al Nadeem morreu após esperar 35 dias por uma permissão para sair de Gaza para tratar seus problemas cardíacos. Tinha 26 anos. Os medicamentos que necessitava nunca chegaram, mas seu caixão sim.
O Ministério da Saúde palestino registrou até agora 375 mortes causadas pela falta de medicamentos em Gaza. A maioria dos medicamentos ficam barrados nos postos de controle israelenses até que tenham sua data de validade vencida.
Mas não há data de vencimento para os cerca de 10 mil caixões que foram doados a Gaza. Estes caixões, sim, podem entrar no território costeiro palestino submetido a um duro bloqueio israelense.
No final de setembro, mais de 70 por cento dos medicamentos doados a Gaza, avaliados em vários milhões de dólares, tiveram que ser descartados por haver passado de suas datas de vencimento, informou o Ministério da Saúde palestino.
“Grande parte dos medicamentos doados vinham de estados árabes”, disse à IPS o diretor do Departamento Farmacêutico, Mounir Al-Boursh.
O funcionário indicou que as nações árabes entregaram mais de 10.300 toneladas de remédios, em um valor estimado de 25 milhões de dólares. Contudo, só 30 por cento destes puderam ser usados, explicou Al-Boursh. O restante venceu ou está ainda nas mãos dos israelenses.
Outro problema enfrentado é em relação à eliminação dos medicamentos vencidos. Se eles são descartados com o lixo comum, pode-se pôr em risco a saúde da população de Gaza.
A Organização Mundial da Saúde (OMS) está preocupada com “a eliminação insegura dos medicamentos e outros materiais médicos”, disse um porta-voz do organismo à IPS.
Enquanto medicamentos são perdidos, as autoridades em Gaza receberam 10 mil caixões, cerca de mil deles para meninos e meninas, informou Al-Boursh. No entanto, isso não “supre as necessidades”.
Gaza necessita de 110 tipos de medicamentos e 123 classes diferentes de equipamentos médicos. Calcula-se que o território ficará sem remédios nos próximos meses.
A anunciada minimização do bloqueio israelense até agora não significou um maior ingresso de suprimentos médicos.
Os medicamentos mais necessitados são os destinados a crianças, os utilizados nas maternidades e os que tratam enfermidades como câncer, epilepsia, hemofilia e talassemias (doenças do sangue).
“A morte tem se tornado uma rotina”, disse uma jovem mulher de Jabaliya, ao norte da faixa de Gaza, enquanto esperava em um corredor do Hospital Infantil de Al Nasser. Ao seu lado, os pais de Israa Tabsh, de dois anos, lutam para salvar a sua pequena de um problema cardíaco congênito.
“Temos esperado durante semanas a permissão para sair de Gaza para que ela seja submetida à cirurgia cardíaca que necessita”, disse o pai, Fayez Al Tabash. O hospital Al Maqased, em Jerusalém oriental, oferece o tratamento adequado, mas Tabsh não pode chegar até lá.
A família, como tantas outras, necessita primeiro de uma autorização de saída e depois da garantia financeira do Ministério da Saúde na Cisjordânia, governada pelo partido secular Al Fatah. Gaza está controlada pelo Hamas (sigla árabe do Movimento de Resistência Islâmica).
Obter esse apoio financeiro é quase impossível para a maioria dos pacientes. “São necessárias conexões”, disse uma mãe de 53 anos que solicitou uma garantia para seu filho. “Estamos encurralados entre funcionários corruptos e a morte”.
Os pacientes em Gaza dependem do governo da Cisjordânia para obter permissões e medicamentos.
Em 2010, Gaza recebeu só 22 por cento dos medicamentos que necessitava da Autoridade Nacional Palestina, indicou Al Boursh. Os suprimentos diminuem. “Em 2008 havíamos recebido 50 por cento, e em 2009, 49 por cento”.
Por outro lado, os medicamentos que chegam a tempo não são armazenados adequadamente. No depósito médico de Al Ghifari, em Gaza, vazam medicamentos. “São os ratos”, disse um zelador. “Eles rompem os frascos e causam os vazamentos [dos remédios]. Os ratos chegam aos medicamentos, e os pacientes aos caixões”, acrescentou.

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